Dabiq: O Estado Islâmico quer a batalha do Fim dos Tempos

por Ryan Mauro,

 

Imagem da revista do Estado Islâmico, Dabiq.

 

O vídeo macabro liberado pelo Estado Islâmico (ISIS ou ISIL) enfatiza que a decapitação de Peter Kassig teve lugar na cidade de Dabiq, na Síria. A cidade foi escolhida por causa de sua importância nas profecias islâmicas do fim-dos-tempos sobre o momento em que o Mahdi e (a versão Islâmica de) Jesus trará a vitória sobre aqueles que se opõem a sharia.

O Estado Islâmico chama a sua revista em Inglês de “Dabiq” pelo mesmo motivo. O grupo está dizendo aos muçulmanos que eles estão cumprindo a profecia, seduzindo-os a participarem de um dos momentos mais importantes na história do mundo.

Uma mensagem secundária é que os apoiadores do Estado islâmico não devem se preocupar com a superioridade militar de seu inimigo ou de retrocessos do grupo terrorista, porque eles irão em breve serem vitoriosos com a ajuda do Mahdi, a figura messiânica do islamismo, e Jesus (quando ele se juntar ao Islã; o que ele irá fazer, de acordo com a profecia islâmica).

“Aqui estamos, enterrando a primeira Cruzada americana em Dabiq, esperando ansiosamente pelo resto de seus exércitos chegarem”, diz um locutor do Estado islâmico.

O vídeo apresenta um trecho de um sermão de Abu Musab al-Zaraqawi, o líder do antecessor do Estado islâmico, a Al-Qaeda no Iraque, até que ele foi morto por um ataque aéreo dos EUA em 07 de junho de 2006.

“A centelha foi acesa aqui no Iraque, e seu calor vai continuar a intensificar … até que ele queime os exércitos dos cruzados em Dabiq”, pregou Zaraqawi.

Em seguida, pela terceira vez, um outro membro do Estado Islâmico diz para o Ocidente, “Estamos esperando por você em Dabiq”.

As declarações são uma referência às profecias nos Hadiths, a coleção de ditos e ações atribuídas a Maomé, o Profeta do Islã.

Um coletor de hadiths, Sahih Muslim, afirma: “A última hora não virá até que os romanos pousem em al-A’maq ou em Dabiq”.

Quando o Estado Islâmico refere-se ao Presidente Obama como o “cão de Roma”, no vídeo, eles estão defendendo a tese de que os EUA são o equivalente moderno do Império Romano e que a ação militar norte-americana no Oriente Médio é a realização dessa profecia.

O Estado Islâmico traça um paralelo entre suas próprias ações e os detalhes da profecia. O hadith afirma que Dabiq será controlado pelos “melhores” soldados islâmicos de Meca, na Arábia Saudita. Eles irão capturar os “Romanos” (ou seja, os americanos), o que levará a um ataque estrangeiro.

O Instituto Brookings aponta que o Estado Islâmico imediatamente apresentou a sua captura de Dabiq, em abril, como parte desta profecia. Os partidários do grupo distribuiu fotos na mídia social dos capturados na colina com o texto da profecia.

As decapitações do Estado Islâmico de Peter Kassig e de outros americanos não são apenas atos justificáveis da jihad em sua opinião. Eles também são atos concebido para provocarem uma agressão sobre eles, como profetizado. Aos seus olhos, a resposta militar dos EUA é realmente desejável, uma vez que cumpriria essa profecia.

A profecia diz que os romanos chegarão em Dabiq e dirão a todos os muçulmanos para se afastarem para que eles possam lutar apenas com os muçulmanos que apreenderam aos cativos. Os muçulmanos, então, unirão-se contra os romanos. O Estado Islâmico está esperando que isso venha a ser concretizado.

Quando a batalha começa, de acordo com a profecia, cerca de um terço das forças muçulmanas fugirá (“a quem Alá nunca vai perdoar”), um terço vai morrer como mártires “excelentes” e o restante um terço vai ganhar a batalha e, em seguida, conquistar Constantinopla (hoje Istambul, Turquia).

Se os partidários do Estado islâmico acreditam que esta profecia é sobre eles, então eles não vão ser desencorajados pela atual ação militar dos EUA, nem pelo grande número de mortes e deserções. Eles vão realmente ser incentivados por isso, porque acreditam que isso acabará por lhes trazer a vitória.

De acordo com a profecia, o que se segue a partir desta vitória em Dabiq e na Turquia é a chegada e a derrota final da versão islâmica do Anticristo, chamado de Dajjal, pelas mãos de Jesus (na versão Islâmica).

Para a maioria dos ocidentais, soa fantasioso sugerir que o Estado Islâmico acredita que está cumprindo essa profecia, mas esse tipo de pensamento é comum entre os islamitas.

A al-Qaeda e seus afiliados muitas vezes falam sobre a eliminação ou sobre a quebra “da cruz”. Esta é uma referência às mesmas profecias. Eles estão falando sobre estarem pavimentando o caminho para que o Mahdi e o Jesus islâmico tragam a vitória final sobre os seus inimigos. A terminologia refere-se a uma profecia islâmica onde Jesus vai quebrar uma cruz para refutar o cristianismo e absorver a religião para o Islã.

A Irmandade Muçulmana também acredita nisso. O IslamWeb, um site com um banco fatwa que afirma as profecias, saúda o líder espiritual da Irmandade Muçulmana, o Sheikh Yousef al-Qaradawi, como “um dos mais eminentes estudiosos contemporâneos, que são reconhecidos por seus conhecimentos e esforços …”.

Os islamistas xiitas também afirmam que estão cumprindo essas profecias. Um documentário produzido pelo escritório do então presidente iraniano, Ahmadinejad, referiu-se a tese de que ele, junto com o líder supremo Khamenei e o líder do Hezbollah, Hassan Nasrallah, encarnam os personagens específicos preditos na profecia islâmica. Boa parte do filme se alinha com as interpretações da profecia islâmica por parte do Estado islâmico e da Al-Qaeda.

Notícias saídas de Khamenei informam, do mesmo modo, sobre eventos atuais através das lentes do fim-dos-tempos. Uma repórter libanesa, em uma publicação árabe, escreveu que a intervenção iraniana na Síria e a guerra civil em curso é vista pelo regime iraniano e pelo Hezbollah como o palco para o aparecimento do Mahdi.

Os EUA e seus aliados não devem evitar de enfrentarem o Estado Islâmico por causa da preocupação de que isso irá reforçar suas reivindicações proféticas. A segurança nacional e os direitos humanos estão em jogo. Em vez disso, os EUA podem virar o jogo, usando a profecia.

A validade dos créditos do Estado islâmico repousará sobre a captura de Dabiq, sobre a chegada das forças terrestres norte-americanas, sobre a união dos muçulmanos por trás do Estado Islâmico e sobre a vitória militar contra os EUA e seus aliados na região.

Portanto, podemos invalidar as reivindicações do Estado islâmico através do não envio de forças terrestres dos EUA para a região, fortalecendo então aos adversários muçulmanos do Estado islâmico, forçando o grupo de Dabiq e os derrotar de uma maneira decisiva. Se isso acontecer, as proclamações do Estado Islâmico sobre o cumprimento profético serão desacreditadas.

O problema fundamental de islamitas que buscam desencadear nessa época, os eventos do fim-dos-tempos, permanecerão. O Estado Islâmico poderia ser esmagado, mas outros semelhantes, acredita-se, irão surgir. Toda essa mentalidade de se cumprir a profecia através da guerra precisa ser desafiada pela busca de paz com os muçulmanos.

Um método defendido pelos reformistas muçulmanos, como Ahmed Vanya, ataca a autenticidade dos hadiths citados, uma vez que eles não são considerados automaticamente a palavra de Deus da mesma forma como o é o Corão.

As referências proféticas do Estado Islâmico é parte de um problema teológico maior. Os muçulmanos precisam abordar o entendimento tradicional das profecias islâmicas do fim-dos-tempos e o papel dos muçulmanos em desencadearem a sua realização.

 

* Artigo traduzido por mim, link original aqui: Dabiq: The Islamic State Wants the Battle of the End of Days

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